domingo, 29 de julho de 2012

Contingências


Mês de Junho é o mês das Festas de Lisboa. Os bairros históricos da cidade preparam-se para receber as gentes de todo o país. Em Alfama, um dos bairros mais antigos de Lisboa, começa muito antes de Junho o início dos preparativos para a noite Santo António, para muitos está em causa o rendimento para todo o ano.

Num bairro onde talvez 80% da população seja idosa, dos 20% que restam apenas meia dúzia tem um emprego, os outros vivem daquilo que ganham neste mês, para além do Rendimento Social de Inserção que lhes está garantido todo o ano.

Os famosos retiros começam logo a ser pensados no início do ano, há que procurar madeiras para fazer as bancadas porque as que serviram no ano anterior já estavam podres e não se pode guardar para o ano seguinte, porque há uma lei que não lhes permite que as tábuas que foram usadas num ano sejam utilizadas no ano seguinte. Está escrito nas regras do bairro “não guardes para o próximo ano aquilo que utilizaste neste ano”.

Mas, aparte destes pormenores é de louvar o árduo trabalho que esta população tem para deixar tudo preparado para que chegue então o mês de Junho para começar a trabalhar. Durante este mês, toda a gente em Alfama trabalha, nem aquele que é tipo mais preguiçoso do bairro tem tempo para descansar e beber um copo e fumar o seu cigarro, tem que estar tudo preparado para receber os jovens e as famílias que veem beber um copo ou comer uma sardinha.

Esta é a realidade que nunca é falada e que se passa todos os anos, pessoas que não precisam de trabalhar porque o Estado oferece o Subsidio de Sobrevivência e que como se não bastasse, facturam num mês aquilo que a maioria das pessoas não ganha num ano. A fiscalização aos retiros fica apenas cingida aos cuidados de higiene, os milhares (e são mesmo milhares) de euros que são ganhos por estas pessoas não são taxados pelo Estado, não há facturas, não há pagamentos de impostos, apenas há que pagar o aluguer do espaço para montar a banca que se fica pelo 20 ou 30€.

Toda a gente nascida e criada em Lisboa conhece esta realidade e no entanto ninguém faz nada para alterar estes acontecimentos que são repetidos todos os anos.

Naturalmente que há exepções, como é o caso dos senhores das roulottes de farturas que, por serem considerados vendedores ambulantes e que fazem desse negócio o seu ganha-pão, pagam 100 vezes mais para ter a sua caravana estacionada no local durante 3 dias.


Por Hemal Maugi

Coerência

“Conformidade entre factos ou ideias. Nexo, conexão.”



Esta é a definição de “Coerência” no dicionário de Língua Portuguesa, e é na falta dela que reside o problema da sociedade portuguesa.

A falta de conformidade entre os factos ou as ideias dos portugueses, nos últimos 38 anos, tem sido alarmante. Claro que não defendo a ditadura, nem sou adepto de Salazar, mas vejamos a questão de fundo: Salazar era coerente. Agia de acordo com o que pensava. Havia conformidade entre as suas ideias e aquilo que executava. O nexo e a conexão não se perdiam no meio deste processo.

O mesmo não se pode dizer sobre a maior parte das figuras políticas desde então. Podem ter as melhores ideias do mundo, “as mais nobres e belas”, mas a falta de coerência não permite a garantia da conexão e do nexo entre aquilo que pensam e aquilo que fazem. Acabam sempre por nunca fazer aquilo que pensam, daí a célebre expressão: “Prometem, prometem mas nunca fazem nada!”.

O meu ponto é este: é mais fácil mudar o pensamento do “Salazar”, tendo sempre a garantia que o processo entre as suas ideias e as suas ações é feito com nexo e coerência (ou seja, o que pensa vai fazer!), do que garantir a quem não é coerente, que o caminho entre ideias e ações não é alterado (como constantemente verificou-se ao longo dos últimos 38 anos).

Mudar o pensamento do “Salazar” apenas requer o poder de argumentação.


Por Ricardo Cabral