quinta-feira, 27 de março de 2008

A democracia mais nova do mundo


O Butão era até agora uma monarquia hereditária onde não existia uma constituição escrita. O actual Druk Gyalpo é o sexto da linhagem Wangchuk e exerce as funções de Chefe de Estado e Chefe Supremo das Forças Armadas, bem como a posição de protector de todas as religiões do país. O Governo Real do Butão era composto por dez ministérios e o órgão executivo máximo era o Lhengye Zhungtsho (Conselho de Ministros). O mais alto órgão legislativo era o Tshogdu (Assembleia Nacional).


O processo de democratização do Butão é algo que já está em marcha há alguns anos e tem sido desenvolvido no ritmo de evolução próprio do Butão. Esta é a próxima fase do processo de modernização do país pelo Druk Gyalpo (Rei do Butão) Jigme Dorji Wangchuck (avô do actual Druk Gyalpo). O facto da democratização do país ter sido levada a cabo de “cima para baixo”, proporciona um clima de estabilidade política durante a transição, que é pouco comum. Também fazem parte deste processo a descentralização do poder, a reorganização e a consciencialização política por parte de uma população que tem vindo a ganhar importância nestes últimos anos.


Em declarações ao Kuensel em 2002, o anterior Druk Gyalpo Jigme Singye Wangchuck afirmou, “Eu tenho dito ao longo destes trinta anos, que o destino da nação está nas mãos do povo...a população é mais importante que o Rei. Nós não podemos deixar o futuro do país na mão de uma pessoa. Estas não são meras palavras. A Constituição será o cumprimento do destino do país nas mãos do povo.” Este monarca chegou mesmo a prescindir do poder absoluto em 1998, reforçando as competências do Tshogdu. A 14 de Dezembro de 2006 o Druk Gyalpo Jigme Singye Wangchuck passou as responsabilidades de monarca ao seu filho, o Príncipe Jigme Khesar Namgyel Wangchuck, que passou a ser o mais novo chefe de Estado do mundo. Todavia o sistema político butanês não tem uma tradição muito democrática nem se move através do sufrágio, pois está baseado num sistema tradicional que tem vindo a ser remodelado ao longo dos anos. Este princípio democrático mais básico só era exercido pelos chefes de família, aquando das eleições do poder local e nacional, e com algumas restrições. As falhas que poderiam surgir desta falta de tradição democrática têm sido compensadas quer pela lentidão do processo, quer pela tentativa de incorporar as “lições” de outras democracias mais consolidadas.


O Tshogdu foi um elemento crucial na prossecução deste processo, no que toca ao delinear das bases desta jovem democracia, muito influenciada pelo modelo britânico.
Foram levadas a cabo várias tentativas de incorporar na sociedade butanesa a ideia de democracia. Vários workshops foram criados nesse sentido, por iniciativa do Governo Real do Butão ou por iniciativa dos próprios partidos. Chegou até a ser feita uma “eleição falsa”, que se destinava a dar um “gostinho” do que seria uma eleição. Os jovens foram os elementos base desta “eleição”, pois preenchiam os lugares de candidatos. A Comissão de Eleições teve também um papel chave nesta transição. Toda a estrutura que sustenta o processo eleitoral, teve de ser construída a partir do nada. Desde a formação de pessoal habilitado, à regulamentação das “regras do jogo”, esta comissão teve um papel preponderante. As “eleições falsas” serviram inclusivamente para testar a viabilidade da estrutura criada e para identificar problemas (por exemplo nas máquinas de voto electrónico).


Já em Dezembro de 2007, foi eleita a câmara alta e esse foi o primeiro desafio do jovem sistema parlamentar. Convém relevar que os partidos não foram os elementos chave das eleições para o Conselho Nacional, pois os seus membros não podem pertencer a partidos políticos, por impedimento constitucional.
Junto com as eleições para a Assembleia Nacional veio a surpresa, pois esperava-se que a disputa eleitoral fosse mais renhida. O DPT liderado por Jigmi Thinley, arrebatou 44 dos 47 assentos da câmara baixa, deixando para o PDP (liderado por Sangay Ngedup) apenas 3 assentos. Não há uma diferença marcante entre os objectivos base dos dois partidos, muito por força da forte influência que a tradição tem sobre os eleitores. Segundo a Comissão de Eleições, dos 318.465 votantes, a ida às urnas corresponde a 79,4%, uma percentagem que certamente representa uma vitória para uma nova democracia.


O DPT após a tomada de posse terá pela frente a orientação do Butão democrático. Porém alguns problemas foram certamente herdados, tais como os refugiados, uma sociedade exposta pela primeira vez aos “problemas modernos” ou os ataques bombistas que tem vindo a acontecer. Será interessante observar se este país irá conseguir manter o apego à tradição e se irá prosseguir uma política orientada pelo F.I.B. O Butão tem um futuro democrático pela frente e só podemos esperar que faça um bom uso dele. Citando um provérbio butanês, “sampa zang na sa dang lam yang zang, sampa nyen na sa dang lam yang nyen”, ou seja se o pensamento é bom, o lugar e o caminho também serão; se o pensamento é mau, o lugar e o caminho também serão.

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